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Por que ainda discutimos home office em (quase) 2018?

20-11-2017 Posted by Comportamento, Marketing de Conteúdo, Mercado 0 thoughts on “Por que ainda discutimos home office em (quase) 2018?”

Virou quase uma benesse: as empresas – em sua necessidade de parecerem populares e antenadas – oferecem aos seus futuros funcionários, candidatos afoitos e animados com uma nova possibilidade profissional, o famigerado home office. O sorriso brilha de longe: “é uma nova política que estamos implementando”, diz o recrutador. Todos acreditam, apertam-se as mãos. Aparentemente perfeito.

Afinal, pertencer a um grupo empresarial que realmente acredita que a produtividade de um colaborador está além de sua presença física é quase um sonho para milhões de trabalhadores. E você, justamente você, pode ter esta oportunidade única de levantar sem despertador, tomar seu café com calma e, se preferir, acompanhar e-mails e planilhas na sala de sua casa, no conforto do seu lar, com os pés para cima.

Parece óbvio, certo? Nem tanto.

O home office como estratégia de contratação, retenção e gerenciamento de talentos nas empresas evoluiu, mas ainda está anos luz de ser uma realidade em todas as posições ou setores. É inegável que a adoção da medida melhora o equilíbrio entre trabalho e qualidade de vida dos funcionários. Pesquisas inclusive apontam para isso: os novos modelos de trabalho proporcionados pelas nuvens e redes mudou sensivelmente esta tendência e evidenciou a necessidade deste equilíbrio entre vida profissional e privada para manter a produtividade e, acima de tudo, a sanidade.

O estudo Global Evolving Workforce, realizado pela Intel e pela Dell em 2015, afirmou por exemplo que, entre os profissionais brasileiros que trabalham de casa, 49% sentem menos estresse, 45% dirigem menos, 33% dormem mais e 52% têm mais tempo para a família. Foram 5 mil profissionais entrevistados, em 12 países, contratados por empresas de diferentes portes. E a tecnologia de segurança, avançada, deixou de ser um questionamento com relação à integridade dos dados corporativos há muito, muito tempo.

http://convergecom.com.br/tiinside/webinside/11/02/2015/pesquisa-diz-que-trabalhar-home-office-traz-mais-produtividade/

Então, se colaboradores rendem mais, ficam mais felizes, têm mais saúde e até entregam com mais eficiência, por que, quase em 2018, ainda discutimos o assunto?

Bem, não há muitos meses, uma das maiores empresas de tecnologia do mundo, precursora no sistema home office e que, inclusive, se vangloriava bastante disso – exigiu que 40% da sua força de trabalho voltasse imediatamente ao escritório – ou rua!

Justamente ela, que anunciou aos quatro ventos recentemente que “os trabalhadores remotos (…) eram altamente envolvidos, mais propensos a considerar seus locais de trabalho como inovadores, mais felizes sobre suas perspectivas de emprego e menos estressados ​​do que seus colegas mais tradicionais e vinculados ao escritório “. Mágico, não?

Mas enquanto essa receita de sucesso era disseminada na imprensa em todo o mundo, sua CEO começou a vetar o trabalho remoto, começando pela área de vendas da empresa. A diretora de marketing da mesma companhia, por sua vez, anunciou no início de fevereiro deste ano que os funcionários da sua divisão teriam que se mudar para um dos seis locais de marketing “estratégicos” em todo o país (Austin, Nova York, Atlanta, San Francisco, Cambridge e Raleigh) ou deixar a empresa. A política, segundo matéria do Wall Street Journal, foi implementada nos últimos três meses para outras divisões da organização.

Por fim, um ultimato final: os funcionários precisariam realocar os membros de sua equipe, solicitar um emprego diferente na filial da corporação mais perto de casa ou, simplesmente, deixar a empresa. Os problemas financeiros enfrentados foi um dos impulsionadores dessa mudança brusca de postura, que pode cortar a enorme folha de pagamento da companhia, para o caso de funcionários insatisfeitos com as novas diretrizes.

Mas seria esse mesmo o caminho?

Outras culturas, outras visões

Uma outra pesquisa que encontrei, dessa vez a Gallup, nos Estados Unidos, vai na contramão do caso apresentado acima: os americanos estão, cada vez mais, trabalhando de suas casas. 43% dos americanos empregados disseram que passaram pelo menos algum tempo trabalhando remotamente, de acordo com a pesquisa de mais de 15 mil adultos – o que representa um aumento de quatro pontos percentuais desde 2012, quando uma pesquisa nos mesmos moldes foi realizada pelo instituto.

Mas nem tudo são flores, diz o Gallup: trabalhadores dos serviços comunitários e sociais, ciência, engenharia, arquitetura, educação, treinamento e bibliotecários não entram nesta conta. Já os empregados em áreas como finanças, seguros e indústrias imobiliárias são mais beneficiados, quando o assunto é trabalho remoto.

Porém, curiosamente, funcionários que passam três a quatro dias distantes do seu “site” de trabalho sentem-se mais envolvidos no trabalho.

http://convergecom.com.br/tiinside/webinside/11/02/2015/pesquisa-diz-que-trabalhar-home-office-traz-mais-produtividade/

Se aparentemente todos ganham com isso, onde ainda reside a dúvida? Talvez algumas das explicações sejam realmente estruturais: a mobilidade urbana não acompanhou nem de longe a mobilidade digital. É possível conectar-se com dezenas de pessoas ao mesmo tempo, em diferentes lugares do mundo, mas isso só será possível se, por sorte, aquela ponte não estiver completamente congestionada, o trem não tiver problema nas linhas, o ônibus conseguir circular livremente em sua faixa exclusiva – que, ao menos no Brasil, só existe em algumas localidades.

O tempo médio gasto nos percursos de casa até o trabalho aumenta consideravelmente a cada ano – média de quase uma hora nas principais capitais brasileiras. Segundo estudo relacionado da Fundação Getúlio Vargas, a duração da viagem aumenta em uma relação inversa à renda do trabalhador – e é esticada em mais seis minutos e meio a cada 10 mil novos carros que chegam às ruas. Resultado disso? Tempo e dinheiro perdidos para ambos os lados, impactos consideráveis na saúde e, claro, também no meio ambiente.

Poucos empregadores se dão conta, entretanto, reduzir custos fixos de manter uma estação de trabalho permanente e poder recrutar funcionários sem se ater a restrições geográficas são alguns dos ganhos que o home office traz para a empresa. Especialistas discutem não somente o cenário como um todo, mas os ganhos para toda a uma sociedade: redução de carros na rua, menos congestionamentos, menos tempo no trânsito, menos emissão de gases poluentes, etc.

Mas a prática mesmo é que o home office ainda é vendido como um benefício, como um vale transporte ou refeição. Uma espécie de recompensa, quando na verdade deveria ser analisado como um fator determinante de negócios, um futuro caminho para as relações profissionais. A regra, na maior parte das corporações, ainda é associar a proatividade, a participação e a eficiência na entrega apenas com a presença física na sede.

Outro estudo, realizado nos Estados Unidos com mais de mil profissionais de diferentes setores da indústria, comércio, e com empresas de diferentes portes, mostrou números bastante curiosos sobre o tema.

De acordo com a Owllabs, empresa norte-americana de videoconferência, 52% dos trabalhadores locais trabalham em casa ao menos uma vez por semana. As áreas de vendas contratam cerca de 66% de trabalhadores remotos a mais – muitos deles também contratados remotamente. Empresas pequenas têm duas vezes mais chances de contratar trabalhadores remotos. E, dos dados mais interessantes: os remotos podem contribuir até mais do que as suas gerências, mesmo estando longe do escritório.

A pesquisa também derruba uma das grandes lendas argumentativas de quem ainda defende o trabalho presencial: trabalhar remotamente não afeta negativamente o investimento dos funcionários em seus trabalhos, nem mesmo esvai o conhecimento sobre a cultura da companhia.

Por outro lado, existem outros desafios intangíveis que os trabalhadores enfrentam.

https://www.owllabs.com/state-of-remote-work 

Mesmo assim, boa parte dos colaboradores gostaria de experimentar este método de trabalhar.

https://www.owllabs.com/state-of-remote-work

Novos tempos, novas leis

A regulamentação da prática do trabalho remoto na nova Lei Trabalhista brasileira talvez possa mudar um pouco dessa história por aqui. Segundo ela, tudo o que o trabalhador usar em casa será formalizado com o patrão via contrato – e isso corresponde a equipamentos, energia, internet. E o controle do trabalho executado será realizado por tarefa, e não por horário, como se costuma contabilizar ainda hoje.

A única lei que tratava do assunto até então datava de 2011, sancionada pela então presidente Dilma Rousseff. E embora previsse mesmos direitos de CLT, não se aprofundava nos detalhes de execução e nem a distinção entre o trabalho realizado no escritório físico ou à distância – inclusive no controle da jornada. A nova lei também define, entre outros detalhes, que mesmo o comparecimento às dependências do empregador para a realização de atividades especificas não descaracteriza o home office. E a base definida será mesmo feita por meio de um acordo entre as partes.

Ainda poderão ser definidas no contrato as atividades que serão realizadas pelo empregado, além das condições para aquisição, uso, manutenção ou fornecimento dos equipamentos e infraestrutura para a prestação do trabalho remoto, bem como para o reembolso das despesas arcadas pelo empregado. O empregador também deverá instruir os empregados sobre regras de saúde, ergonomia e de segurança do trabalho, que devem ser acatadas pelos funcionários.

O home office não é benefício, não é moleza, não é tranquilidade. Mas é, certamente, o melhor lugar para se trabalhar quando se tem organização, disciplina e foco. E empresas precisam acreditar que só têm vantagens quando proporcionam esta possibilidade aos seus colaboradores. Trabalho, essencialmente, é o que entregamos, aquilo que fazemos virar, acontecer. E não o local fixo geográfico para onde nos dirigimos – e cujo tempo de deslocamento já poderia ter proporcionado, ao menos, um deadline cumprido.



Aline Sordili

Aline Sordili, é jornalista com especializações no mercado digital pela New York University e pela Hyper Island. Atualmente, é diretora de desenvolvimento de novos negócios da Record TV, consultora de empresas, professora e palestrante.

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